Política

A vida do ex-prefeito Nascimento longe do Coração do Rio Grande

Jaqueline Silveira

Figura histórica da política de Santa Maria, o ex-prefeito Osvaldo Nascimento da Silva, 82 anos, acompanha de longe as notícias do Coração do Rio Grande. Há 11 anos, ele mora distante cerca de 520 quilômetros da cidade onde fez sua carreira profissional como advogado e construiu sua trajetória política. 

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O recanto escolhido para viver a aposentadoria foi Araranguá, cidade localizada no extremo sul de Santa Catarina, próxima à divisa com o Rio Grande do Sul. Lá, ele vive com a mulher Alzira e perto dos netos. Com problemas de saúde, Nascimento decidiu mudar-se para Araranguá, cidade de 62 mil habitantes, para ficar aos cuidados de um dos netos, que é médico.

– Vim prá cá por problemas de saúde, fiz uma cirurgia e levei 28 pontos. Hoje, estou bem graças a Deus – conta ele, que completará 83 anos no dia 23 de setembro.

Com os cabelos completamente brancos e com uma ótima memória, ele relata com detalhes sua trajetória política, que iniciou como vereador pelo então MDB, nos anos 70. Na mesma década, Nascimento chegou ao cargo máximo da cidade: elegeu-se prefeito e teve o mandato prorrogado por mais dois anos por decisão do Congresso Nacional. 

Renato Rocha, ex-vereador; Valmir Farias de Ávila, Alzira Ávila da Silva, Osvaldo Nascimento da Silva e Neiva Pujol de Ávila em uma das raras visitas do ex-prefeito à  cidade que governou  duas vezes. Nascimento mora hoje em Santa Catarina Foto: Renato Rocha / Arquivo Pessoal

Suas obras, também discorre com facilidade. Coincidência ou não, o ex-prefeito mora no município conhecido como "Cidade das Avenidas", e algumas das suas obras mais importantes foram, justamente, a construção de tradicionais avenidas: Borges de Medeiros, Medianeira e Fernando Ferrari. O Calçadão Salvador Isaia e o Parque Itaimbé, exceto os viadutos, também foram feitos na primeira gestão.

O número de obras que mudou a cara da cidade na época, recorda Nascimento, foi possível pela vinda de recursos federais a fundo perdido, por meio do Programa Comunidade Urbana de Recuperação Acelerada, conhecido  por projeto Cura.

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Com uma boa administração, Nascimento carimbou o passaporte rumo à Brasília. Ele foi eleito deputado federal pelo PDT e participou de dois dos momentos mais marcantes da história do Brasil pelo fim da ditadura: a votação, em 1984, a favor da Emenda Dante de Oliveira por eleição direta, que acabou derrubada por uma diferença de 22 votos, e a escolha do presidente da República pelo colégio eleitoral.

– Votei no Tancredo Neves – contou o ex-prefeito, referindo-se ao presidente eleito e que acabou não assumindo o cargo.
Atualmente, Nascimento acompanha pela imprensa o período conturbado que o Brasil vive, desta vez em plena democracia.

Foto: Arquivo Pessoal

– O sistema político tem de mudar para acabar com caixa 2 e mensalão. Acho que também tem de diminuir 50% do Senado e da Câmara para reduzir gastos – opina.

Pouco antes de terminar o mandato de deputado, o ex-prefeito saiu do PDT e não concorreu à reeleição, contrariado com a aliança entre seu partido e o PDS para disputar o governo do Estado ( leia mais ao lado). 

TRAJETÓRIA POLÍTICA

– Advogado, foi vereador por duas legislaturas, de 1970 a 1976, pelo MDB. Na primeira, ficou como 1º suplente e assumiu a vaga deixada pelo titular. Na época, não havia salário pelo trabalho de vereador

– Em 1976, foi eleito prefeito de Santa Maria também pelo MDB. O mandato foi prorrogado para seis anos e ele acabou deixando o Executivo antes de finalizar a gestão para concorrer a deputado

– Em 1982, elegeu-se para a Câmara dos Deputados pelo PDT. Quase no final do mandato, deixou o partido e ingressou no PTB contrariado pela aliança entre PDT e PDS ao governo do Estado

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– Em 1996, elegeu-se novamente prefeito de Santa Maria pelo PTB

–Em 2000, concorreu à reeleição, mas não teve êxito

– Nas eleições de 2002, disputou vaga à Assembleia Legislativa novamente pelo PDT, depois, em 2004, a vereador, ambas sem êxito

ALGUMAS OBRAS

Confira algumas das principais obras das duas gestões de Osvaldo Nascimento em Santa Maria

–Parque Itaimbé

–Construção das avenidas Borges de Medeiros, Medianeira e Fernando Ferrari

– Calçadão Salvador Isaia

– Esgoto da Vila Salgado Filho

Parque Itaimbé, construído na primeira gestão de Nascimento na prefeitura, é uma das marcas do político na cidade Foto: Germano Rorato / Agencia RBS

– Instalação da usina de asfalto

– Recapeamento das vias de circulação dos ônibus

– Ponte na localidade de Pavão, divisa entre Santa Maria e São Gabriel

– Aquisição da área da Linha da Fronteira, nos arredores da Gare da Estação

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Segundo mandato marcado por polêmicas

Em 1996, desta vez, pelo PTB, Nascimento chegou novamente à prefeitura. Diferentemente da primeira administração, a segunda gestão teve bastante contestação e, em certos momentos, chamou mais atenção pelas polêmicas, como as Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI) instaladas na Câmara de Vereadores para apurar supostas irregularidades no seu governo, do que pelas obras.

O ex-prefeito, entretanto, discorda dessa avaliação. Para ele, as duas administrações se equipararam. Uma das obras de que mais se orgulha é a instalação da usina de asfalto, permitindo o recapeamento de grande parte das vias da cidade, priorizando as de circulação dos ônibus.

– Na minha opinião, a primeira (administração) não superou a segunda. Depende da visão de ótica, peguei a cidade toda esburacada – afirma Nascimento, citando, ainda, a Escola Municipal de Aprendizagem Industrial (EMAI), creches, campanha do agasalho e a aquisição da área da Linha da Fronteira, nas proximidades da Gare, como realizações do segundo mandato.

Nascimento se despediu da prefeitura, no final de 2000, deixando para trás salário e 13º atrasados dos servidores. Ele alega que ficou sem dinheiro em caixa, porque o Banrisul teria cobrado antecipadamente as prestações do empréstimo feito pela prefeitura para a compra de máquinas.

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– O Banrisul resgatou as parcelas em novembro e fiquei sem recurso para a folha de dezembro e o 13º salário – diz ele, enfatizando que o empréstimo deveria ser quitado no ano seguinte, mas que a antecipação teria ocorrido por decisão do Palácio Piratini, na época governado por Olívio Dutra (PT).

Processos

Desgastado politicamente, o então prefeito concorreu à reeleição, mas não teve êxito – o hoje deputado Valdeci Oliveira foi eleito pelo PT, que, pela primeira vez, chegava ao comando da cidade. 

Até hoje,  a segunda administração causa dor de cabeça a Nascimento. Alvo de ações de improbidade, o ex-prefeito teve sua casa em Santa Maria penhorada e o caso se arrasta na Justiça. 

Devido à instituição de um programa social em 1998, que ficou conhecido como moeda legal, com foco em crianças, adolescentes e adultos em situação de vulnerabilidade, ele foi condenado a ressarcir os cofres públicos.

Conforme o advogado de Nascimento, Paulo Inhaquite, que foi procurador do município por um ano e meio no final do seu governo, o valor permitia a dispensa de licitação para emissão da moeda legal e fazer os outdoors do programa. Contudo, o Ministério Público entendeu que era necessário o processo licitatório, movendo a ação que hoje tramita no Superior Tribunal de Justiça (STJ).

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– A casa é o único bem que possuo. Entrei com patrimônio na política e saí pobre – comenta Nascimento.

Atualmente, ele ocupa o tempo com caminhadas pela manhã com a mulher Alzira no clube próximo a sua casa, com leituras de livro espíritas e fazendo poemas – que já são mais de 800, segundo ele. Em meio à vida calma e tranquila em Araranguá, cultiva a saudade de Santa Maria, cidade que visitou há cerca de um ano.

– Tenho muita saudade! Dizem que eu fugi da cidade, jamais! Eu amo essa cidade e sou grato ao povo de Santa Maria – frisou Nascimento.

Da política, o ex-prefeito se mantém afastado.

– Estou sem partido, meu partido é a sociedade – ressalta.

Entretanto, mantém um olhar especial para a política de Santa Maria, mesmo a distância.
– Como está o Pozzobom aí? – indaga ele, durante a entrevista, sobre a gestão de Jorge Pozzobom (PSDB).

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E completa:

– Eu achei que o Pozzobom ganhava aí, a família dele tem serviços prestados à cidade – justificou o ex-prefeito.

Sobre voltar à cena política, indagação feita por alguns eleitores, Nascimento não titubeia:

– Deus me livre.

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